quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Entender nossos impulsos


O domínio de si próprio, embora eu não negue de forma alguma a sua necessidade em muitas circunstâncias, não é a melhor forma de conseguir que um ser humano se conduza bem. 
Tem o inconveniente de diminuir a energia e as faculdades criadoras. 
É como uma pesada armadura que ao mesmo tempo que impede o vosso braço de bater nos vossos vizinhos, o torna igualmente incapaz de um movimento útil. 
Os que não têm outro apoio além da disciplina que se impõem a si próprios, tornam-se obstinados e timoratos com receio de si próprios.

Mas os impulsos aos quais eles não permitem qualquer saída, continuam a existir neles a tal como os rios represados, cedo ou tarde transbordarão. 

As forças a que nós contrariamos a função natural que é o desabrochar da nossa própria vida, ou se atrofiam ou acabam por ter uma saída perturbando a vida de outrem. Elas procurarão qualquer saída do género das que não representam nenhum perigo para nós, por exemplo, a tirania doméstica. 
Se essa saída não for suficiente, há outras que o podem ser. 
Há sempre condenados e párias a quem a sociedade permite torturar e isso não comporta nenhum risco.
Esses párias, tanto podem ser criminosos como escravos. 

Do ponto de vista da virtude ultrajada, a lei penal tem o mérito de oferecer uma saída a esses impulsos agressivos que a covardia, disfarçada em moralidade, refreia nas suas formas mais espontâneas. 
A guerra tem a mesma vantagem. 
Vós não podeis matar o vosso vizinho que detestais talvez cordialmente, mas um pouco de propaganda é suficiente para transferir esse ódio a qualquer nação estrangeira, contra a qual todos os vossos instintos assassinos se transformarão em heroísmo patriótico.

Bertrand Russell, in 'A Última Oportunidade do Homem'

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